jeudi 22 mai 2008

Corpus Christi longe de casa...

Amigos, compartilho um texto do Frei Betto, aproveitando para partilhar que é um tanto estranho passar o dia de Corpus Christi em um lugar onde a maioria das pessoas sequer sabe que esse dia existe. Quanto mais o que ele significa...



A economia dos corpos

Somos o corpo que temos e temos o corpo que somos. Se somos glutões, ansiosos, melancólicos, o corpo definha ou estufa, refletindo a alma sombria. Se somos alegres, comedidos e orantes, ele reluz.

Na festa do Corpo de Cristo, a Igreja celebra essa concretude interrelacional que é a nossa corporalidade, pela qual nos inserimos no mundo. E o Verbo se fez carne, proclama o poema que abre o evangelho de João. E habitou entre nós, não somente no sentido histórico, de Deus que se manifestou no jovem de Nazaré, mas também na dimensão da profundência mística: nosso ser é habitado pelo divino e se diviniza quanto mais se humaniza.

Deus é a nossa vocação mais radical. Só Nele o desejo cessa, a ansiedade se anula, a insatisfação se aplaca. Tateamos, contudo, por labirínticas veredas que nos distanciam de Deus quando somos muito religiosos e pouco amorosos; contemplamos o Céu e ignoramos a Terra; adoramos o Invisível e nos mantemos indiferentes ao semelhante que sofre.

O Cristianismo é, por excelência, a religião da economia dos corpos. Em sua natureza semítica não há lugar para o dualismo platônico, que faz do corpo cárcere do espírito e, deste, o retrato em negativo da concupiscência da carne. No batismo, nosso corpo é lavado no sangue de Cristo. Na eucaristia, ele se nutre do corpo de Deus. No matrimônio, “numa só carne” os corpos se fundem no amor que transubstancia o carinho em liturgia e a sexualidade em fonte prazerosa de vida. Assim, a fé cristã sacraliza a corporalidade humana, templo vivo de Deus, e repudia tudo aquilo que a profana: opressão, exclusão, humilhação, violência, fome etc.

Seria outro o efeito da política se ela centrasse seu programa, não em reajustes monetaristas, mas na economia dos corpos. Então, ela desceria do pedestal das abstrações numéricas para encarar corpos sem pão e sem terra; desamparados e prostituídos; desempregados e enfermos. Corpos destituídos de direitos, de dignidade e de beleza.

O culto ao corpo está em moda. Multiplicam-se as academias de ginástica e de dança, onde o corpo molda-se tonificado pelo ilusório elixir da juventude. Favorece-se a saúde e a estética. Vigorosos e vistosos, os corpos nem sempre adquirem mais capacidade de relação consigo, com o outro e com Deus.Ser capaz de escutar o próprio corpo, tratá-lo com sabedoria, refinando seu espírito e evitando empanturrá-lo de comidas e mágoas, bebidas e cóleras. É preciso impedir que "a louca da casa", a imaginação, ateie fogo em nossos sentimentos e emoções. Fazer silêncio dentro de si. Deixar fluir a voz interior. E tratar o semelhante como sacramento vivo. Abrir-se ao Deus que nos habita pela graça, pela fé e por essa fascinante história da evolução do Universo que, desde o Big Bang, culmina nesse fruto inefável da natureza que é cada um de nós.

Somos o Universo que se contempla a si mesmo. Em cada pessoa — no menino de rua e no sultão — o Cosmo se espelha e se descobre harmônico e belo. Cada partícula atômica de nossas moléculas dançarinas, que tecem as células que estruturam o nosso corpo, foi cozida no calor de uma estrela. Feitos de matéria estelar, somos todos filhos do Sol, como intuíam os indígenas astecas e andinos.O corpo de Gaia também é corpo de Cristo. A Igreja deveria incluir entre os pecados a devastação de florestas, a poluição do ar e dos rios, a contaminação dos mares. Deveria clamar mais alto, não apenas em prol das espécies animais ameaçadas de extinção, mas sobretudo em favor da espécie mais degradada pela fome e pela violência: a humana.

Gente é para brilhar, canta o poeta. Se em nossa sociedade os corpos não brilham ou brilham só quando besuntados de cosméticos, e não banhados de luz interior, algo anda errado. A festa de Corpus Christi quer nos fazer recordar que corpo é copo, cálice, onde se bebe o vinho da alegria e da salvação, inserido no corpo místico e cósmico do Cristo.Só haverá futuro digno quando todos os corpos viverem em comunhão, saciados da fome de pão e de beleza.




• Frei Betto é escritor, autor de "Entre todos os homens" (Ática), entre outros livros.
[retirado de: http://www2.uol.com.br/debate/1159/colunas/colunas03.htm]

2 commentaires:

bibi move a dit…

Oi Ila,
que legal saber que vocês estão aproveitando a cidade!
Dei uma zappeada no teu blog e vi que vocês estnao morando no ventro, é vero?
Nós estamos no Plateau, perto do Parque La FOntaine, voces já conheceram?
Bom, esse final de semana esou participando de um evento- começa hoje de noite e vai até domingo. Aliás, talvez te interesse, hoje de noite tem o keynote do Steven Shaviro e no domingo no final do dia será uma instalação participativa chamada SLow CLothes. Será na SAT- societé dart e technologie- mil coisas. Faz o seguinte, liga pra mim assim que vires essa ensagem: 5143034107. estou em casa até umas 4:30 depois tenho que ir no centro.
bj
Bianca

Anonyme a dit…

Ila, Frei Betto sabe muito de muitas coisas!! Lindo esse texto!!
Desejo que teu corpo esteja em plenitude e que tua alma esteja em luz!!!
Com carinho, Dinda.